Não me sobrou nada
O que tem em mim é um peso de 60 anos
de amputações
Eu choro toda vez que a luz da realidade me invade
porque eu choro toda vez ao lembrar que envelheço
A velhice chega quando a lembrança
são lembranças,
quando
se é jovem só se pode lembrar uma única época,
a infância
Hoje só penso de
como eu deveria ter desistido da vida
para viver
E digo: - jovens! Abandonem a vida...
Pare de só ler,
porque só não será nada
Livro é para movimentar também,
livrar-se do si que não é você
Se era mais gostoso caminhar no sol comendo uma maçã,
porque me
vesti tanto (?)
porque me apedrejei em
torres de cimento;
porque tantos papéis;
porque acumulei objetos (?)
Que caverna é essa que nunca saímos?
...
[Eu gritaria até meu pulmão cansar, mas nem fôlego
me resta. Converso através de uma máquina e nesse momento ela me pede para aguardar enquanto o scanner está descendo, para minha morte ser perfeita só falta tocar uma música do Bowie de fundo...]
Dos restantes finais nada me resta
das lembranças que pesam só o amor valeria
se ele um dia tivesse permanecido
mas nem isso...
E o que me resta, ir embora?
Vou sentar...
(Paulo Afonso S. da Silva)