terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

AL-SP-RN

Desenho de Diego Soares




Acho que já te contei essa história, se já tiver pode me interromper viu? Mas é que as coisas nunca foram fáceis por aqui. Nordeste sabe? Demorava pra chover, mas a gente sempre deu um jeito, ou era na caminhada mesmo ou quando me juntei com meus irmãos e os tios e cavamos um poço lá no sítio mesmo. Mas não é da seca que eu quero falar não, até porque parece que vocês vão começar e entender um pouquinho dela. Eu quero é falar de quando fui pra capital.
Não, não São Paulo. Maceió. O sítio ficava lá no interior de Alagoas, e conforme os irmão foram crescendo foram seguindo sua vida. Eu fiquei no sítio mesmo, o Tião continuou em Craíbas mas foi pro centro da cidade, o Zézinho foi tentar a sorte em Brasília mas não deu certo e acabou voltando tem 7 anos, o Geraldo se deu bem lá no Goiás dizem que tem até piscina na casa dele lá, a Zefa, sua mãe, casou e foi pro São Paulo, só sei dela por telefone mesmo, depois que voltei lá da sua casa nunca mais vi ela. Mas aí sobrou a Neide né? Minha pequena casou também, homem bom o Chico, foram morar lá pra Maceió.
Eles tavam lá tinha 3 anos já quando tomei coragem de pegar a van pra ir pra capital… Eles sempre iam me visitar. Teve uma vez até que eles me trocaram a tv! Mas então, quando fui pra lá cheguei e não conseguia entender muito bem o que tava acontecendo, porque não é que eu não tivesse visto rua asfaltada, já tinha visto sim, até pavimentaram a que passa lá na frente do sítio, mas ainda assim aquela rua do sítio ainda era vermelha da terra, e aí juntava com o chão que era um marrom-avermelhado, tem as casas que eram sim coloridas, mas tudo meio desbotado e sempre amarela, branca ou azul, então era tudo um tom vermelho mesmo, o cinza da rua era vermelho, a amarelo das casa, até o azul ficava meio vermelho. Mas quando eu cheguei primeiro lá em Maceió achei tudo cinza, pensei até em como a Zefa aguentava São Paulo, que ela falava que era ainda pior, nessa época você não tinha nascido então eu não conhecia o Sul né? Daí lá em Maceió tinha umas ruas grandes demais, e quanto carro! Nunca tinha visto tanto carro assim! E não vi nenhum cavalo no tempo que fiquei lá, lembro que achei aquilo bem estranho. E o chão, o chão não era vermelho, nem quando era terra batida mesmo, mesmo a terra lá era mais escura um marrom diferente.
Cheguei lá e eles me buscaram de carro, fiquei os primeiros dois dias lá na casa dos seus tios mesmo, porque era dia de semana. Mas quando deu sábado eles me levaram pra Ponta Verde. Menino, quando eu vi aquele mar, aquelas barracas na praia, a quantidade de coco que tinha ali encostado no calçadão, lembro que tava um solzão e ele refletia naquela água verde e brilhava. Meu filho, nunca vi tanta cor e nem tanto sal! Dava pra sentir na boca o gosto quando o vento batia, e o vento batia toda hora, o que era bom porque o calor tava infernal.
Desde que aquele dia eu decidi que ia morar na praia, e trabalhei pra isso. Juntei o dinheiro que o sítio dava com as plantações de fumo, arrendei um pedacinho pro dono do mercadinho plantar uns legumes, trabalhei de pintor, pedreiro, entregador, carpi um monte de sítio que tinha por ali, ficava de caseiro quando o pessoal ia viajar e quando você nasceu sua mãe me chamou pra ajudar lá e me dava um dinheirinho que eu guardei tudo. Até que quando faltava só um pouquinho do dinheiro, vendi meu lote saí da minha Alagoas e vim aqui pra Touros, que é essa beleza que você tá conhecendo.

Agora vê se termina esse almoço e se troca que vou te levar pra ver o Farol.



<Augusto Nessuno>